EPPGGs discutem “privacy-washing” em artigo no Jota
“Poderia uma empresa, sob a justificativa de proteger os dados pessoais de seus usuários, acabar adotando condutas que causem distorções concorrenciais?”. Essa é a pergunta que as EPPGGs Carolina Fontes, Cristiane Albuquerque e Patrícia Cabral buscam responder em artigo publicado no Jota.
Tal uso de justificativas de proteção de dados como artimanha para prejudicar a concorrência já contrapôs gigantes como Apple e Meta, dona das marcas Facebook, Instagram e Whatsapp. A Meta acusa a Apple de “privacy-washing”, ou seja: afirmar estar defendendo a privacidade de seus usuários quando, no fundo, quer apenas impedir que outras empresas lucrem – também – com estes dados, sem de fato os proteger.
“Distinguir o que é uma justificativa legítima e o que são alegações infundadas para a adoção de uma conduta restritiva à concorrência pode ser uma tarefa bastante complexa”, apontam as autoras. Afinal, para isso, é preciso conhecer o funcionamento do mercado, as práticas adotadas por outros players ou em outros mercados geográficos e, frequentemente, considerar os regulamentos que regem aquele mercado.
Elas afirmam, dessa forma, que restrições concorrenciais por razões de segurança ou proteção de outros interesses do consumidor (como privacidade) podem ser legítimas e justificáveis em determinadas situações. “Por outro lado, [...] há situações em que argumentos dessa natureza podem ser usados para encobrir a existência de uma finalidade anticompetitiva”, ressalvam.
Além do exemplo da briga entre as grandes empresas de tecnologia mundiais, as EPPGGs relembram o caso de regulação e concorrência na distribuição de combustíveis de aviação no Brasil, sobre o qual já falaram aqui.
Para elas, é óbvio que alguns pressupostos precisam estar presentes para que seja caracterizado dano concorrencial, como a posição dominante da empresa que adota a conduta em determinado mercado relevante – o que estaria configurado de forma muito evidente nos exemplos trazidos no texto. “É preciso também que a autoridade de concorrência entenda o que são proteções de fato legítimas (o que não é trivial, dada a considerável assimetria de informação entre empresas e autoridade) e se há remédios que conciliem concorrência e proteção de dados pessoais”, defendem.
Em conclusão, as EPPGGs ressaltam que, embora o debate sobre privacidade e proteção de dados pessoais seja recente, as justificativas de proteção do consumidor já estiveram presentes em outros casos no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade): “Ainda que esses casos anteriores envolvam mercados distintos, a lição que fica é a necessidade de cooperação com os reguladores setoriais e de outras matérias, como proteção de dados pessoais e defesa do consumidor, para que, num contexto de elevada assimetria de informação, a autoridade concorrencial consiga avaliar com maior propriedade esses argumentos de segurança”, finalizam.