Aposentados e pensionistas cobram benefícios
Reportagem do jornal "Correio Braziliense" fala de processos gerados pela demora do governo federal em regulamentar as gratificações criadas para premiar os servidores que têm boa atuação no funcionalismo público
A intenção do governo federal ao criar as gratificações ao funcionalismo público por desempenho era positiva. O objetivo foi aumentar os salários e premiar quem de fato trabalha — e bem. Mas a inércia do Ministério do Planejamento e do Palácio do Planalto deixou essas gratificações sem regulamentação por até 12 anos, criou uma série de problemas e inundou o Judiciário de processos. Milhares de servidores aposentados e pensionistas estão conseguindo receber, nos tribunais, a totalidade dos valores pagos aos ativos desde que a remuneração extra passou a existir. Estima-se que a fatura chegue a R$ 5 bilhões.
No total, entre 1998 e 2008, foram criadas 64 gratificações no Executivo, todas dando direito ao recebimento da eventual diferença. Os benefícios estão espalhados por 92 órgãos da administração direta, fundações e autarquias, agregando 90% dos servidores — 570 mil ativos e 565 mil inativos. Segundo as leis que instituíram a remuneração variável por produtividade, os servidores inativos tinham direito a receber entre 30% e 50% do valor da gratificação, enquanto os ativos faziam jus a 80% pelo menos até a regulamentação. É essa diferença que os aposentados e pensionistas buscam na Justiça.
A confusão se agigantou devido à demora do governo para definir o modelo de avaliação dos funcionários. Somente em março do ano passado, o Palácio do Planalto publicou decreto fixando as regras para a avaliação individual dos servidores de 48 das gratificações. Antes disso, nove delas tiveram as normas definidas entre 2007 e 2009. Há ainda oito à espera da regulamentação. Algumas são muito antigas, como a Gratificação de Desempenho de Atividade Técnica de Planejamento (GDATP), nascida em 1998, cujas regras para medir a produtividade dos servidores da pasta só foram editadas em setembro do ano passado.
Em casa ou na praia
Os valores variam conforme o nível e o padrão do servidor — vão de R$ 80 e R$ 400 por mês. Os aposentados e pensionistas querem o benefício maior possível, mas nem todos receberão porque não entraram na Justiça ou perderam o direito de receber pelo atraso no ajuizamento dos processos. O prazo para pedir o ressarcimento é de cinco anos. Assim, só é possível obter as parcelas não repassadas dos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação.
No Judiciário, o direito dos aposentados já está pacificado em todas as instâncias. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram que eles têm direito ao valor recebido pelo pessoal da ativa, até que efetivamente haja a avaliação por desempenho. Enquanto isso não ocorrer, trata-se de gratificação genérica e, por isso, deve ser estendido aos inativos o mesmo percentual pago aos servidores que continuam trabalhando e contribuindo para gerar riqueza ao país. Não importa se os aposentados e pensionistas estão em casa assistindo a televisão ou na praia, sem nada mais agregar ao serviço público.
O STF chegou a editar, em dezembro de 2009, súmula vinculante reconhecendo o direito dos inativos a gratificações. Em abril de 2010, foi a vez de a Advocacia-Geral da União (AGU) emitir súmula reconhecendo o direito dos servidores inativos e orientando os advogados e procuradores federais a não recorrerem das sentenças. Por causa do grande volume de processos, as turmas recursais do Juizado Especial do Rio de Janeiro foram mais abrangentes e publicaram o enunciado nº 68, listando 45 gratificações pagas pelo Executivo federal que devem ser estendidas em sua totalidade aos inativos, além das recentemente criadas, “pela falta de regulamentação e efetiva aplicação das necessárias avaliações de desempenho”.
Nessa leva de servidores beneficiados, não conseguiram embolsar o mesmo valor recebido pelos ativos os advogados da AGU, que recebiam, até a instituição do pagamento por subsídio em 2008, a Gratificação por Atividade Judiciária (GDAJ), criada em 2000. O STF entendeu que a avaliação individual foi feita desde o início, portanto, não é genérica.
Fonte
Correio Braziliense – 10 de outubro de 2011