EPPGG debate diplomacia cultural e a projeção da imagem do Brasil durante a Ditadura Militar
O último número da Brasiliana - periódico do King's College dedicado ao estudo do Brasil - aborda, sob diferentes perspectivas, o papel dos militares na política brasileira. Na edição, o EPPGG Rogério de Souza Farias assina o artigo “Diplomacia cultural: uma arena de embates na Ditadura Militar”, em coautoria com Bruno Zétola.
No texto, os autores confirmam a existência de embates significativos no período ditatorial sobre o que deveria ser a diplomacia cultural e sobre qual imagem o Estado brasileiro deveria projetar ao mundo. O termo “diplomacia cultural”, aliás, refere-se exatamente à política pública que tem como objetivo desenvolver uma narrativa nacional ou - em outras palavras - de “contar a história do país para o resto do mundo”.
Entre as disputas, Farias e Zétola destacam aquela sobre a função social da produção cultural: se deveria ser elemento de reflexão e engajamento social ou se a arte deveria ser concebida como um campo de entretenimento, mais autônoma e, dessa forma, abrindo possibilidades de projetação no campo internacional de uma imagem negativa do Brasil, um país permeado por violência, pobreza e desigualdades.
Os autores argumentam ser inegável que a Ditadura Militar buscou eliminar o apoio a artistas cujas preferências políticas e estéticas se chocavam com grupos mais conservadores, base do regime. Os valores desses grupos é que nortearam a perspectiva propagandística da diplomacia cultural do período: “É sob esse prisma que Vasco Mariz [chefe do Departamento Cultural] entendeu ser a obra ‘Deus e o Diabo na Terra do Sol’ [de Glauber Rocha] uma sucessão de brutalidades de ‘resultado artístico duvidoso’, estando próximo de ‘subversivo’, além de grotescamente anticlerical, recomendando que se recolhessem as cópias de propriedade do Itamaraty no exterior”, afirma o texto.
O filme “O Pagador de Promessas”, de Anselmo Duarte, também foi considerado “peça de notório caráter subversivo”. Como consequência dessas análises, foi proposto um mecanismo de censura no Itamaraty, anterior ao envio de obras para embaixadas e consulados ao redor do mundo. A avaliação da censura do Ministério da Justiça não parecia suficiente para o objetivo de, além de afastar filmes que não retratassem bem o Brasil, avaliar o “ângulo político” de maneira cuidadosa, rejeitando qualquer obra que oferecesse teor ideológico “manifestamente subversivo”.
Discussão atual
Permanece, ainda nos dias atuais, a relevância da discussão sobre como apoiar artistas abertamente críticos ao governo. “Igualmente relevante é discutir que tipo de imagem o Estado brasileiro deseja projetar para o mundo. Deseja-se construir uma versão asséptica e aspiracional, ou seria melhor reproduzir a complexidade de uma sociedade violenta e desigual?”, indagam os autores, para quem essa dicotomia não foi superada na Ditadura e tampouco mostra sinais de ter sido resolvida no período democrático.