Fundeb aprovado na Câmara e sua contribuição para as políticas educacionais
O maior problema do Brasil é sua desigualdade, inaceitável sob qualquer ponto de vista. Para reduzi-la, comumente atribui-se à educação o papel de garantir igualdade de oportunidade.
Para tal, é preciso garantir o direito à aprendizagem a cada uma das crianças no país, independente do local de nascimento, de cor, etnia, gênero, renda. A educação da criança que nasce no interior do Maranhão tem que ser a mesma da criança que nasce em um bairro nobre de qualquer cidade brasileira. Só assim teremos igualdade de oportunidades no Brasil.
Para quem gosta de política pública, o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) é um mecanismo interessante. Antes do Fundeb, o investimento por aluno na escola pública estava totalmente vinculado à arrecadação de cada município. Na prática, isso levava a uma diferença de 10.000% entre quem investia mais e quem investia menos.
Como o Fundeb reduziu essa desigualdade? Para responder, é preciso entender como o fundo funciona. O Fundeb é, na verdade, a composição de 27 fundos estaduais formado por 20% de quase todos os impostos estaduais e municipais. O imposto é arrecadado, “depositado” no fundo e, em seguida, distribuído proporcionalmente ao número de matrículas. Com esse mecanismo, o valor para educação é definido pelo número de alunos, não pela capacidade de arrecadação. Para reduzir ainda mais a desigualdade, a União deposita 10% do total arrecadado e repassa aos fundos dos estados mais pobres.
Esse mecanismo foi criado com validade de 10 anos e vence em 2020. Por isso, uma nova emenda constitucional começou a ser debatida para definir as regras após o vencimento. A PEC 15/2015 foi aprovada na noite de 21 de julho de 2020, com importantes avanços para a educação brasileira. O que foi aprovado?
1. O Fundeb passa a ser permanente porque foi incorporado às políticas educacionais brasileiras. Hoje é impensável a educação pública sem o Fundeb, os municípios mais pobres deixariam de contar com recursos fundamentais para fazer o básico.
2. A complementação da União aumentou de 10% para 23%, sendo que 10% continua como era antes; 10,5% passa a ser distribuído por meio do Valor Aluno-Ano-Total (VAAT), sendo que metade deve ir para a educação infantil; 2,5% distribuídos a partir de critérios de qualidade.
3. A inovação do VAAT contribui para reduzir ainda mais a desigualdade. Com ele, o valor mínimo passa a considerar todas receitas dos municípios, não apenas a arrecadação do Fundeb. Com isso, municípios pobres em estados ricos passam a receber a complementação e municípios ricos de estados pobres recebem uma complementação menor.
4. Distribuição da cota-parte municipal do ICMS por critérios educacionais: uma das mais importantes inovações feitas pelo Estado do Ceará e que contribuiu para os bons resultados educacionais naquela Unidade da Federação, passa a ser obrigatório em todo país. Cada Estado deverá aprovar uma lei direcionando no mínimo 10 p.p. do ICMS que vai para os municípios a partir de melhorias na educação. Essa medida é importante porque os recursos do ICMS não têm vinculação, o que faz com que seja bastante atrativo para os prefeitos.
5. Mínimo de 70% para pagamento de profissionais da educação: os países da OCDE pagam, em média, 79% com pessoal. As escolas são formadas por estudantes, professores e demais profissionais.
Há algumas outras mudanças, mas essas listadas anteriormente são as principais. Dadas as circunstâncias do país, foi uma importante vitória. A ampliação do volume de recursos não é garantia de melhoria da qualidade da educação. Deve vir acompanhada de melhorias na gestão, na formulação, implementação, monitoramento e avaliação das políticas públicas que serão financiadas com estes recursos. Ninguém discorda que gestão é fundamental, mas não é a escassez extrema de recursos que faz brotar gestão, mas investimento em formação, qualificação, intercâmbio de experiências e sistemas de controle efetivos que induzam a qualidade. É aí que o trabalho qualificado de servidores públicos faz a diferença na gestão.
Rogério da Veiga é especialista em políticas públicas e gestão governamental no Governo Federal e atualmente é secretário-parlamentar no gabinete do Deputado Federal Idilvan Alencar, é mestre em política científica e tecnológica pela Universidade Estadual de Campinas.