'Não haverá concessão por ser ano eleitoral'

Em entrevista ao jornal "Valor Econômico", secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Duvanier Paiva, fala, entre outros pontos, sobre negociações salariais no governo de Dilma Rousseff

No cargo desde junho de 2007, o secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Duvanier Paiva, foi o responsável por negociar os acordos que promoveram os maiores reajustes para o funcionalismo público federal desde a redemocratização. Todos eles assinados no segundo mandato do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Sem a intimidade com o movimento sindical que o seu antecessor tinha, a presidente Dilma Rousseff optou por manter em seu governo o mesmo negociador. Entretanto, se na era Lula Paiva teve o papel de distribuir aos funcionários públicos as benesses do crescimento econômicos, no primeiro ano de governo Dilma seu papel foi o de segurar as categorias após lhes passar as informações sobre os poucos, quase nulos, reajustes de 2011.

"Foi um ano difícil. Todo primeiro ano tem naturalmente uma posição cautelosa em relação a orçamento e gasto, principalmente com pessoal. E também houve a crise internacional", disse em entrevista ao Valor.

Sua avaliação é de que em 2012 esse relacionamento tende a ser mais conflituoso, não só pelas incertezas da crise, mas também por ser ano eleitoral. Segundo ele, além de o tempo para negociações diminuir, a disputa política "se dissemina por todos os espaços". Ele, porém, alerta: "O governo não faz concessão por ser ano eleitoral". Nascido em São Paulo, ele construiu boa parte de sua carreira no meio sindical. Foi assessor político da CUT, secretário de Formação da CUT-SP e idealizador e coordenador da Escola Sindical de São Paulo. Veja a seguir trechos da entrevista ao Valor:

Valor: Há muita reclamação do funcionalismo sobre a relação com Dilma. Por que?
Duvanier Paiva: Sempre houve greve e mobilização. O sindicato é para isso mesmo. Reclama, vem para cima. Está cumprindo o papel dele. Em 2011 tivemos um resultado político importante. Fizemos a mesa permanente de negociação, o que significa um exercício permanente do diálogo. Então todo esse processo de conversação e de diálogo permitiu que chegássemos a um momento em que os sindicatos compreenderam a crise. Fizemos poucos acordos, atendemos demandas represadas, com impacto orçamentário pequeno. Em 2012 haverá pouco impacto de pessoal.

Valor: Como avalia a relação de Dilma com o funcionalismo?
Paiva: Foi um ano difícil. Todo primeiro ano exige uma posição cautelosa em relação a Orçamento e gastos, principalmente com pessoal, um gasto polêmico que a sociedade discute muito. Então houve cautela. Além disso, foi um ano de crise internacional. Então o relacionamento com o funcionalismo ficou difícil. Mas mesmo assim mantivemos o diálogo, mostramos que os reajustes não viriam, até porque os que foram dados no último período Lula foram importantes.

Valor: Essa relação com Lula ajudou a segurar as greves?
Paiva: Em 2007 e 2008 fizemos acordos de médio prazo a serem pagos em três parcelas em 2008, 2009 e 2010. Algumas classes tiveram resíduos em 2011. O governo Lula não deu nada, negociou. Foram conquistas dos sindicatos, resultado da mesa de negociação. Fizemos 48 acordos que resultaram na reorganização de várias carreiras e de toda a estrutura remuneratória do funcionalismo federal, com resultados expressivos para várias carreiras da União.

Valor: Há uma mudança na relação do governo Dilma com Lula?
Paiva: Não há. A comparação é óbvia e natural, mas a presidenta tem demonstrado que é um governo de continuidade em relação aos compromissos assumidos pelo anterior, com a valorização do trabalhador e dos segmentos mais vulneráveis da sociedade. As prioridades mostram que há continuidade de governo. O fato de não ser sindicalista não significa que ela não tenha uma visão da importância da classe trabalhadora. Algum sindicalista pode achar que não, que a relação com Lula era diferenciada, mas no resultado não há diferença. Exemplo disso é a política de salário mínimo. Na nossa opinião, não há qualquer prejuízo do ponto de vista histórico e político. Ela tem compreensão das classes sindicais.

Valor: Mas praticamente todos estão falando em greve.
Paiva: É natural. Em 2011 teve esse problema da crise e era também o primeiro ano de governo. Houve poucos reajustes. Então neste ano vai ter uma pressão grande. A mesma que encontramos em 2003, quando assumimos. Havia uma defasagem [salarial] grande, que foi recuperada. Os sindicatos acham que precisam conquistar o máximo agora porque em 2011 fizemos só o necessário, ou seja, porque só atendemos à demanda represada dos anos anteriores. Então é natural que estejam se preparando para vir para cima da gente com toda a força. Mas também estamos preparados. Nossa preparação é o diálogo. Eles sabem que o que vai resolver é a conversa na mesa de negociação.

Valor: Deve ser o ano mais difícil dos governos do PT?
Paiva: Tem uma dificuldade que é o fato de ser ano eleitoral. O calendário encurta.

Valor: Qual o efeito de uma eleição nessa negociação?
Paiva: Em ano não eleitoral temos até agosto para conversar, que é o prazo para o Orçamento ser enviado. No ano eleitoral, temos que resolver, no máximo, em julho, fim de junho. Temos menos tempo. E é um ano de disputa política. Há um grau de mobilização maior.

Valor: O governo tende a ceder mais?
Paiva: O governo não faz concessão por ser ano eleitoral. O espaço de tempo para negociar é menor, todos os interesses e projetos políticos estão ligados, há intensa mobilização e debate, tudo está em jogo e a disputa política acaba se repetindo e se disseminando por todos os espaços. Mas os próprios sindicalistas sabem que o governo não vai ficar mais frágil ou ceder mais porque é um ano eleitoral. Isso é um fetiche. O que há é a eleição funcionando como um intensificador do debate, o que significa que o resultado da negociação vai ser de qualidade.

Valor: Ainda sobre as reclamações, parece que os governadores enfrentaram muito mais problemas com seus servidores do que a União. Concorda?
Paiva: A diferença é a negociação. Relação de trabalho é conflituosa. Mas todos acham que na administração pública não há conflitos porque o servidor adere a um estatuto e não a um contrato de trabalho. Isso criou um senso comum de que essa relação de trabalho não é conflituosa. Isso é falso. Há conflitos. Por isso o governo desenvolveu a negociação. Existe uma mesa permanente que trata de todas as relações com o servidor federal. A diferença é essa. Existe um processo de tratamento desses conflitos.

Valor: O que mudou do governo Lula para o de Dilma?
Paiva: Como sou secretário desde o governo Lula, meu olhar é de continuidade. E tem um dado importante. Sou secretário de Recursos Humanos e a partir de fevereiro vou ser secretário de Relações do Trabalho. Será uma secretaria voltada especialmente para tratar das relações com o servidor. Significa valorizar a negociação, ter uma estrutura própria para isso. A presidenta, então, consolida um processo de negociação. Vamos ter uma estrutura em tempo integral para tratar exclusivamente do relacionamento com o servidor.

Fonte
Valor Econômico – 12 de janeiro de 2012