Portaria do Ministério da Saúde que vetou diretrizes para tratamento medicamentoso a paciente com covid revela desprezo a servidores
A Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ANESP) manifesta seu repúdio à Portaria SCTIE/MS Nº 8, de 25 de janeiro de 2022, assinada pelo Secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde do Ministério da Saúde, que não aprovou as Diretrizes Brasileiras para Tratamento Medicamentoso Ambulatorial do Paciente com Covid-19.
Tais orientações foram elaboradas por um painel de especialistas sob coordenação do Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias e Inovação em Saúde do Ministério da Saúde (DGITIS/SCTIE/MS) e recomendava a não utilização de uma série de medicamentos considerados ineficazes para tratamento da covid-19, dentre eles, a hidroxicloroquina.
Várias sociedades médicas participaram do desenvolvimento das Diretrizes, endossando suas recomendações, quais sejam:
● Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE);
● Associação Médica Brasileira (AMB);
● Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV);
● Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI);
● Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC);
● Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT).
O documento técnico havia sido aprovado pela CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde), ainda em dezembro de 2021, em sua 7ª reunião extraordinária.
A CONITEC é atualmente coordenada por servidora de carreira, veterana e experiente em políticas públicas de saúde. Como Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGG), a coordenadora proferiu o voto final pela aprovação das Diretrizes. A servidora possui mais de duas décadas de experiência no serviço público federal, trabalhando no desenho e implementação de políticas públicas. No entanto, sua substituição no cargo que ocupa tem sido aventada em razão de seu posicionamento técnico não alinhado à ala ideológica do governo federal.
Entendemos que o episódio reforça a adequação do modelo de estabilidade funcional dos servidores adotado pelo Brasil, e ameaçado pela proposta de Reforma Administrativa apresentada por este governo (PEC 32). É inaceitável que órgãos técnicos sejam pressionados para romper seu compromisso e responsabilidade para com o Estado e a população.
Não se trata de assunto polêmico, mas de debate já esgotado na ciência e no espaço público. Em Comissão Parlamentar de Inquérito conduzida pelo Senado Federal, restou flagrantemente claro à sociedade brasileira os impactos perversos de insistir e priorizar tratamentos inadequados quando a vacinação é um método preventivo eficaz e universalmente aceito. Além da vacinação, a testagem em massa e o uso de máscaras de boa qualidade deveriam estar no foco de atenção da política de saúde contra a covid-19, e não a defesa do uso de medicamentos comprovadamente ineficazes.
A pressão sobre a servidora, sobretudo nesse tema, revela o profundo desprezo da atual gestão com os servidores públicos federais e a falta de compromisso com a seriedade e o rigor de que se devem revestir as pessoas que exercem funções públicas.
Brasília, 28 de janeiro de 2022.
Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental - ANESP