Celso Furtado, um intelectual a serviço do país

“Aos intelectuais cabe-lhes aprofundar a percepção da realidade social para evitar que se alastrem as manchas de irracionalidade que alimentam o aventureirismo político; cabe-lhes projetar luz sobre os desvãos da história onde se ocultam os crimes cometidos pelos que abusam do poder; cabe-lhes auscultar e traduzir as ansiedades e aspirações das forças sociais ainda sem meios próprios de expressão.”
Celso Furtado (1984)

O último dia 26 de julho foi marcado pelos 100 anos de nascimento do paraibano Celso Monteiro Furtado. Seu centenário tem sido celebrado ao longo de 2020 com ações que revisitam o legado e a obra deixados por ele, na forma de debates, artigos, livros, vídeos e outras tantas atividades. O Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento sistematiza essa agenda. O Sindicato dos Funcionários do Ipea – Afipea organizou uma semana para celebração do centenário.

Com uma trajetória inspiradora e de distinta integridade intelectual, Celso Furtado, que nos deixou em 2004, foi um dos mais importantes economistas do Brasil e sempre aliou a análise criteriosa das condições e da dinâmica do subdesenvolvimento brasileiro, com a prática política e a gestão de instituições públicas, a exemplo da Cepal, BNDES, Sudene e dos Ministérios do Planejamento e da Cultura.

Furtado ultrapassou os limites da academia e se tornou um gestor público, ocupando cargos políticos e técnicos centrais para o desenvolvimento do país.

Foi nomeado em 1962, no regime parlamentar, o primeiro titular do Ministério do Planejamento, quando elaborou o Plano Trienal apresentado ao país pelo presidente João Goulart por ocasião do plebiscito que visava confirmar o parlamentarismo ou restabelecer o presidencialismo.

No ano, seguinte deixou o Ministério do Planejamento e retornou à Superintendência da Sudene, concebendo e implantando a política de incentivos fiscais para os investimentos na região.

O Ato Institucional nº 1, publicado três dias depois do golpe militar de 31 de março de 1964, cassou os seus direitos políticos por dez anos. Teve início seus anos de exílio. A partir de 1979, quando foi votada a Lei da Anistia, começou a retornar com frequência ao Brasil, reinserindo-se na vida política e sendo eleito membro do Diretório Nacional do PMDB.

Em janeiro de 1985 foi convidado pelo recém-eleito presidente Tancredo Neves para participar da Comissão do Plano de Ação do Governo. Foi nomeado embaixador do Brasil junto à Comunidade Econômica Europeia, em Bruxelas e integrou a Comissão de Estudos Constitucionais, presidida por Afonso Arinos, para elaborar um projeto de nova Constituição.

Em março de 1986 tornou-se ministro da Cultura do governo José Sarney. Sob sua iniciativa, aprovou-se a primeira lei de incentivos fiscais à cultura.

Os títulos acadêmicos conquistados ao longo da vida de Celso Furtado foram de Doutor Honoris Causa da Universidade Técnica de Lisboa, da UNICAMP, da UnB, da UFRGS, da UFPB e da Université Pierre Mendès-France, de Grenoble, França. Em agosto de 1997, foi eleito para a cadeira nº 11 da Academia Brasileira de Letras.

Com uma produção acadêmica invejável, publicou livros, antologias, ensaios e artigos acadêmicos, prefácios, apresentações e resenhas, tendo diversas obras traduzidas. "Formação Econômica do Brasil", publicado em 1959, é a obra mais consagrada do autor. Esse acervo pode ser encontrado no site do Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento.

Um dos livros lançados em virtude do centenário do economista e com acesso gratuito é “Celso Furtado: os combates de um economista”, editado pela Fundação Perseu Abramo e pela Expressão Popular.

A vida de Furtado também foi merecedora do documentário “O Longo Amanhecer - Cinebiografia de Celso Furtado”, com direção de José Mariani. Produzido em 2007, mostra como o economista não desistiu nunca da ideia da necessidade de um Projeto Nacional capaz de animar a reconstrução do Brasil, como em seu livro homônimo Longo Amanhecer (1998). No filme, que mistura a história econômica do Brasil com a vida de Celso Furtado, o diretor conseguiu uma longa entrevista de quatro horas com o pensador, avesso às câmeras.