Em live sobre fome, EPPGGs apontam impacto negativo de escolhas políticas

“Não deixe ninguém para trás”. O tema do Dia Mundial da Alimentação neste ano, comemorado em outubro, é emblemático e escancara a desigualdade e a fome tão fortemente expressas no Brasil. Foi com essa reflexão que o EPPGG Eduardo Nilson iniciou sua participação na live "Fome no Brasil: desafios da agenda de combate à fome no governo federal", promovida pela ANESP na última quarta (5).

Transmitido ao vivo pelo YouTube e pelo Facebook da ANESP, o debate contou com os EPPGGs Erick Brigante Del Porto, Carmem Priscila Bocchi e Lilian Rahal, todos com larga experiência no desenho e na implementação de políticas públicas de combate à fome e à pobreza no país. 

Além de revelar que, em 37,8% dos lares com crianças de até 10 anos, houve fome ou redução da quantidade e da qualidade dos alimentos, os dados da Rede Penssan divulgados em setembro evidenciaram desigualdades regionais: em 14 estados, o percentual de pessoas que passam fome supera a média nacional (15,5%).

Para contextualizar a discussão, Del Porto propôs um resgate histórico dos avanços e retrocessos nas políticas de combate à fome e trouxe importantes dados sobre a redução de orçamento de políticas estratégicas. “Desde 2013, o orçamento do SUAS vem sendo reduzido. E a partir de 2019, principalmente, ele passa a ficar cada vez mais dependente de emendas parlamentares. Vem caindo um dos pilares que dá sustentação aos indicadores de fome”, avalia. Se em 2014, a dotação prevista para os serviços do SUAS foi de R$2,65 bilhões, para 2023 o Projeto de Lei Orçamentária prevê, até o momento, apenas R$48 milhões.

Da mesma forma, o PAA, agora Alimenta Brasil, teve queda expressiva de orçamento (de R$1,2 bilhão, em 2014, para R$2,7 milhão na PLO-2023), como mostra Del Porto. O Programa Cisternas também teve redução significativa no orçamento.

“O orçamento é uma escolha política também. E vemos as escolhas que vêm sendo feitas.  Uma pesquisa recente trouxe o reflexo do índice de insegurança hídrica na insegurança alimentar. E a gente olha o orçamento do Programa Cisternas e percebe uma opção política por um caminho errado”, completa Lilian Rahal.

Já Priscila Bocchi enfocou o monitoramento da fome e do acesso aos alimentos. “Sempre foi considerado muito importante fazer essa medição para direcionar as políticas públicas. O problema da fome não é porque não tem alimento o suficiente, mas porque as pessoas não têm renda suficiente para ter acesso aos alimentos”, afirma.

Ao longo do processo de consolidação das políticas de segurança alimentar e nutricional, foi construído, no âmbito do CONSEA e da CAISAN, um sistema multidimensional de monitoramento, que dá conta de captar as desigualdades relativas a gênero, raça/cor e populações tradicionais, por exemplo. Esse sistema media o acesso pela renda, a disponibilidade de alimentos e o consumo adequado de alimentos, entre outros fatores. Para cada um deles, uma rede de programas estava constituída, como Bolsa Família, PAA, PNAE, além de políticas relacionadas à regulamentação de publicidade e fortalecimento da alimentação saudável.

“O sucesso dos programas de segurança alimentar e nutricional no Brasil se deveu a esse conjunto de políticas, não era só transferência de renda ou fomento da produção de alimentos. É um conjunto de políticas coordenadas através de uma institucionalidade, que era o SISAN”, afirma Bocchi.

Eduardo Nilson reforça essa ideia, ao abordar a desnutrição. “A desnutrição é uma consequência de determinantes sociais e econômicos que estão fora do setor da saúde. Então tem que haver um diálogo. O que dá um grande salto na organização das políticas é a institucionalidade e a governança. Esse conjunto todo traz metas, monitoramento e participação social. Isso dialoga com maior impacto das políticas”.

Para ele, os inquéritos populacionais mostraram que a grande potencialidade do período de combate à fome foi a sinergia de políticas dentro e fora do âmbito da saúde, que permitiu reduzir tanto a desnutrição aguda quanto a crônica. Exemplo disso é que fator determinante para a redução da desnutrição foi o aumento da educação materna.

Nilsson destaca ainda a atual convivência da desnutrição com o excesso de peso, muitas vezes na mesma família. “É importante falar sobre a dupla carga da má nutrição. O acesso ao alimento saudável muitas vezes está mais dificultado pela questão de preço do que pela não chegada do alimento. Alimentos ultraprocessados estão diminuindo de preço, pela tendência histórica, enquanto alimentos in natura e frescos, que são a base da dieta brasileira, estão aumentando de preço, a ponto de que o acesso é menor”. 

Assista abaixo à live na íntegra: