EPPGG escreve artigo no Jota sobre IA e desenvolvimento nacional

Foto: Ricardo Stuckert/Secom-PR

“IA e desenvolvimento nacional: o lugar do Sul Global” é o título do artigo publicado pelo EPPGG James Görgen no Jota nesta segunda-feira, 17/6. O texto pontua que tanto as empresas-plataforma e os líderes no desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial (IA) quanto os países estão com pressa para acessar globalmente novos mercados para obter ganhos de escala e recuperar o capital investido em inovação na última década.

No entanto, essa corrida é bastante desequilibrada para os países. Com exceção dos Estados Unidos e poucos aliados, os demais Estados nacionais do Norte Global estão um tanto quanto perdidos. Enquanto alguns apostam em regulamentações de naturezas distintas baseadas apenas na proteção de direitos e mitigação de riscos, outros formulam estratégias nacionais pouco conectadas a esforços de desenvolvimento econômico, científico e tecnológico por meio de políticas industriais. Excluindo-se a China, os países do Sul Global estão em condição ainda mais desvantajosa. Sem poder de barganha e aceitando argumentos da parte diretamente interessada em acessar seus mercados.

Além da notável desvantagem científica, tecnológica, de infraestrutura, de capital humano e de recursos públicos para estruturar seus ecossistemas de IA, os países em desenvolvimento estão penando com a falta de uma visão estratégica, que busque algum tipo de autonomia, e com a forte pressão destas empresas estrangeiras em território nacional. Quanto mais exportam dados, maior o cerco.

As estratégias das cinco big techs, além da OpenAI e Anthropic, incluem acordos com órgãos governamentais e instituições públicas, universidades, entidades do setor privado, cursos online gratuitos para estudantes, profissionais e servidores públicos e as campanhas de marketing das próprias empresas e de consultorias, que se apoiam no hype promovido pela popularização da IA generativa.

Mesmo que um país opte por algo que exija maior compliance das empresas de acordo com níveis de risco, a ênfase na proteção de direitos, como adotada pelo AI Act, não resolve o problema de falta de soberania, de amarras concorrenciais e fomento ao desenvolvimento econômico, científico e tecnológico nacionais. Esta abordagem jurídica, originada na majoritária influência de especialistas oriundos da área de proteção de dados pessoais sobre as legislações de IA, cria situações de fato de difícil reversão.

Com iniciativas em várias esferas, do Legislativo ao Judiciário, passando pelo Executivo, o Brasil está em uma posição privilegiada para estruturar seu projeto nacional para IA mas também para fazer a voz do Sul Global ser ouvida nos fóruns internacionais. No início deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na segunda reunião ordinária do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT), conclamou diversos ministros e pesquisadores a apresentarem um plano brasileiro de IA que fizesse o país ser competitivo neste setor. A ideia do presidente é anunciar esta proposta na 79ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, em setembro.

Infelizmente, a visão estratégica de Lula não vem se refletindo nas negociações de textos gerados dentro do Parlamento. Redigido por uma comissão de juristas, em sua maioria oriundos da formulação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o atual PL 2338/2023 possui uma ênfase necessária, porém insuficiente, na questão da garantia e proteção de direitos e no gerenciamento dos sistemas de IA por níveis de risco, fortemente inspirado na minuciosa legislação europeia.

O problema estratégico maior, na verdade, não é o que o texto traz, mas o que ele deixou de fora. Trata-se do acesso aos mercados de dados privados controlados pelas principais plataformas digitais e de IA. Enquanto algumas estratégias nacionais de IA de países europeus, como França e Alemanha, preveem que estes ativos possam ser compartilhados com todos — o chamado data sharing a partir de data trusts — isso não se faz presente em estratégias nacionais de países do Sul Global ou em iniciativas de regulamentação.

Uma das pautas mais importantes e que hoje se tornou um obstáculo em que esbarram as estratégias de desenvolvimento nacional mais soberanas de IA é a localização e a proteção dos dados. Estados que pretendam construir seu ecossistema de IA e que não estiverem preocupados em manter controle sobre os dados gerados em seu território, com a devida monetização e tributação de sua circulação, não terão vantagens comparativas para desenvolver seus sistemas especialistas em relação a estas megaestruturas globalmente constituídas há mais de uma década.

Leia o artigo na íntegra.